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Assimetria na Defesa e Estados Periféricos*


MAR & DEFESA | 20 DE NOVEMBRO DE 2023

Imagem: Composição a partir de imagens disponíveis no artigo original e do artigo disponível em https://hojenasegundaguerramundial.wordpress.com/tag/belgica. Acessadas em 18/11/23.



DA EDITORIA


Antes de introduzir o artigo propriamente dito, cabe ressaltar que o MAR & DEFESA nem sempre endossa as percepções e conclusões dos artigos publicados. Nesses casos, é costume iniciarmos com uma nota introdutória, a fim de contextualizar, corrigir ou completar a matéria. É o que faremos com respeito ao artigo abaixo.


Inicialmente, cabe analisar a proposta do autor no sexto parágrafo em substituir o "conceito ortodoxo" de Defesa para o conceito de Segurança. Existem aí, a nosso ver, dois equívocos: o primeiro, restringir a Defesa a apenas o "emprego de tropas preparadas para repelir invasões externas", desconhecendo que dela também faz parte a Logística de Defesa (da qual a Base Industrial de Defesa é a componente principal); o segundo, de ignorar a conceituação estabelecida pela Política Nacional de Defesa (PND) de que a Segurança Nacional é garantida pela Defesa Nacional, não sendo possível, a rigor, substituir um termo pelo outro. Na verdade, ambos coexistem, sendo que Segurança é um estado de percepção subjetivo, enquanto Defesa é um conjunto tangível de atividades estatais.


Quanto à afirmativa de que "os exércitos [na guerra moderna] estão nos centros financeiros mundiais, não nos quartéis-generais", cabe recordar que os centros de decisão política e financeira sempre existiram, pautando o emprego de exércitos e marinhas ao longo da História. Não é correto, portanto, afirmar que os exércitos estão nos centros financeiros, mas sim que são empregados de acordo com os interesses políticos e econômicos daqueles.


Finalmente, no último parágrafo, o autor sugere que os decisores políticos deveriam privilegiar a destinação de recursos para a ciência, ao invés de para a capacidade bélica. Em tempos de normalidade ou paz, entendemos que sim, e não apenas em ciência, mas em todas as demais componentes da Base Logística de Defesa, com ênfase na capacitação do parque industrial. Em períodos de conflito, entretanto, a ênfase deve recair sobre o fortalecimento do poder combatente das Forças Armadas, compreendendo pessoal e material.


Não obstante as observações acima, entendemos que o artigo evidencia a necessidade de privilegiarmos o desenvolvimento da capacidade científico-tecnológica e industrial de Defesa, buscando reduzir o fosso tecnológico existente entre o Brasil e as potências mundiais.


ARTIGO


No fatídico dia 1 de setembro de 1939, o comandante do 18 Regimento da Brigada de Cavalaria Pomorska, Coronel Kazimierz Matelarz, fez uma carga bem sucedida com sabres contra o batalhão de infantaria da Wermachht acantonado próximo ao vilarejo Krojanty. Poucas horas após, uma coluna de Panzers surgiu no terreno e dizimou os defensores, retomando o terreno ganho a poucas horas e cobrando a vida do próprio comandante polonês, antes mesmo que pudessem se retirar. Nas palavras do General alemão Heinz Guderian, "A Brigada de Cavalaria Polonesa Pomorska, na ignorância da natureza de nossos tanques, tinham dado carga com espadas e lanças, sofrendo perdas enormes". Essa foi uma das últimas cargas de cavalaria registradas na história, e bem exemplifica a assimetria tecnológica.


Quatro séculos antes, aqui mesmo em nossas terras, nações indígenas foram dizimadas pela assimetria de armas com os europeus invasores. O domínio do uso dos metais e da pólvora tornaram inúteis quaisquer focos de resistência. Há inúmeros episódios em que a própria coragem e combatividade de povos foram somente sacrifícios inúteis e incapazes de promover sua defesa, pela simples assimetria de forças. que superaram a valentia e quantidade de tropas.


Pois bem. Passados quase 80 anos da invasão da Polônia pelos exércitos de Hitler, o mundo transformou-se radicalmente. As duas grandes guerras, a corrida armamentista pari passu à revolução tecnológica nos campos da eletrônica, nuclear e de processamento da informação no ambiente da Guerra Fria e, também, no posterior a ela, estabeleceram novas formas de ocupação e domínio que levam a se rever absolutamente os conceitos sobre Defesa.


A tecnologia superou fronteiras, o mundo interconectou-se em gigantescas redes de comunicação, os próprios conceitos de soberania se esgarçaram, passaram a ser a soberania permitida, não mais a conquistada. Países periféricos somente sobrevivem pela conciliação, não mais pelo confronto. Mundos novos chocam na mudança de paradigmas. É mais do que hora de se rever as premissas nacionais de defesa.


Os países do Grupo IV** concentram tal poder assimétrico que não há barreiras possíveis e capazes de impedir sua ação. Os do Grupo III** causariam um pequeno dano. Os outros seriam simplesmente varridos. A presença física do soldado é substituída pelo aparato tecnológico, seja telecomandado, seja pela capacidade de destruição à distância - com mísseis hipersônicos de alcance mundial em alguns minutos e enorme precisão de alvo, lançados a partir de ambiente seguro em seus próprios territórios. Qualquer tentativa de reação remeteria à inútil tentativa do Cel Mastelarz, porém potencializada em grau inimaginável.


Defesa não é mais assunto de quartel, mas de centros de pesquisa e de inteligência. Por incrível que pareça. O conceito ortodoxo de Defesa, com tropas preparadas para repelir invasões externas, necessariamente terá que evoluir para o conceito de Segurança, no qual cientistas ocupam os espaços que tradicionalmente eram de militares. Se já está se tornando impossível a defesa bélica territorial, pela própria assimetria antes referida, cuja integridade somente se mantém pela capacidade de articulação e convivência na qual a diplomacia tem papel fundamental, a segurança das populações adquire maior dimensão, pois as invasões não mais acontecem por tropas e, também, não é a ambição territorial que movimenta a máquina bélica, antes o acesso a riquezas. Os exércitos, nesse caso, estão nos centros financeiros mundiais, não nos Quartéis Generais. A segurança dos países periféricos está na capacidade de gerenciar o melhor uso e exploração de seus recursos.


Concentro-me, agora, à Amazônia, brasileira em sua maior extensão, detentora de recursos incomparáveis. O mundo desperta para a necessidade de sua sobrevivência, e a pauta ambiental está na ordem do dia mundial. Mais do que as próprias riquezas do subsolo, a floresta é ambicionada como floresta, por seu impacto na vida planetária ainda não totalmente dimensionado, porém incontestavelmente existente. Esse é o nosso grande ativo e será nosso "pra valer", se o preservarmos. Até porque, o impacto da floresta em nossa maior região produtora central já é bem conhecido, e a segurança do Brasil depende muito da nossa capacidade de produção agrícola. É bom deixarmos ufanismos e bravatas de lado, a Amazônia somente será nossa se preservarmos sua cobertura vegetal originária. Caso contrário, alguém nos substituirá, ou um organismo internacional, ou mesmo um dos países do Grupo IV.


Pouco importa, num cenário como o aventado acima, termos a melhor e mais preparada tropa de guerra em selva do mundo, assumindo que isso seja verdadeiro. Temos um exemplo muito recente: o Amapá capitulou com 5 dias sem energia. Fica a questão: quantos minutos seriam necessários para que todo sistema elétrico da região fosse desativado ou mesmo danificado? De que adiantam tropas preparadas, sem que possam ser adequadamente supridas? E vão lutar contra quem? Contra drones de alta precisão telecomandados? Contra mísseis? Repetir o bravo Cel Masterlaz?


Países periféricos, como o nosso Brasil, investem recursos significativos, até além do que dispõem, em sua capacidade bélica. Melhor fariam se investissem na ciência e na diplomacia, para sua própria segurança. Esse é o único caminho de sua sobrevivência soberana.



** Classificações apresentadas pelo autor no artigo disponível em fregablog.blogspot.com/2020/07/poder-militar.html. Grupo IV: Pequeno grupo de países em que seu poder, além de repelir invasões territoriais, são capazes de impor seus interesses de maneira global e intercontinental (USA, Rússia e China); Grupo III: Forças capazes de, além de repelir agressões externas de mesmo nível, impor seus interesses aos países dos grupos inferiores (por exemplo, França, Alemanha, Reino Unido). ---


Para entrar em contato com a Editoria do MAR & DEFESA, com o autor do artigo, ou com a mídia que o publicou originalmente, basta enviar mensagem para um dos canais abaixo.


MAR & DEFESA

Poder Marítimo e Defesa Nacional

Contribuindo para o desenvolvimento de uma mentalidade política de defesa no Brasil


Editor responsável: Francisco Eduardo Neves Novellino


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